terça-feira, 19 de abril de 2011

CLAUDIA RODRIGUES FALA SOBRE ESCLEROSE MÚLTIPLA



        O sorriso com que a atriz e humorista Claudia Rodrigues recebeu a reportagem de ÉPOCA sumiu quando ela notou a presença do fotógrafo. “Vai ter fotografia? Não gosto de foto, prefiro vídeo”, disse, na sala de seu apartamento na Gávea, no Rio de Janeiro, uma cobertura com vista para a Lagoa Rodrigo de Freitas, o mar e o Cristo Redentor. Claudia estava vestida à vontade e sem maquiagem. Para ficar arrumada, limitou-se a pôr brincos e um vestido. “Nem um batonzinho?”, disse Lucia Colucci, sua agente. Não. Após a foto, desfez a produção. “Voltei a ser eu”, afirma, satisfeita. Em vários sentidos, Claudia quer voltar a ser ela mesma.

        Claudia é portadora de esclerose múltipla, doença que atinge cerca de 35 mil brasileiros e provoca sintomas como perda de memória, dificuldades motoras e na fala. A doença foi diagnosticada há cerca de dez anos. Os sintomas se agravaram em 2009, levando ao cancelamento das gravações da série A diarista, em que interpretava a protagonista Marinete. Ela se afastou para fazer tratamento. Quase dois anos depois, melhor, ensaia a volta ao trabalho. Na semana passada, aguardava resposta sobre a volta da personagem Ofélia em Zorra total. Acompanhada de sua agente (“ela sou eu”, diz sobre a proximidade das duas), Claudia falou do período em que a doença atingiu seu estágio mais severo e de sua recuperação.


ENTREVISTA – CLAUDIA RODRIGUES
QUEM É
Formada em educação física pela Universidade Gama Filho, seguiu carreira como atriz e comediante. Estudou artes cênicas no Teatro Escola da Rosane Gofman. É mãe de Iza, de 8 anos.

O QUE FEZ
Fez filmes como Xuxa popstar e programas humorísticos de televisão como Escolinha do Professor Raimundo, Sai de baixo, Zorra total e A diarista.

ÉPOCA – Como você descobriu que sofria de esclerose múltipla?


Claudia Rodrigues – Estava na peça Monólogos da vagina, em São Paulo, quando senti uma dormência no braço esquerdo. Achei que fosse cansaço ou algum problema de coluna. O pessoal da produção disse que eu poderia estar infartando, então fui ao hospital. Segunda-feira eu vim a uma clínica no Rio. Fiz exames, não deu nada. A médica pediu ressonância do cérebro. Eu respondi: “Minha cabeça é vazia, mas se você quiser ver…”. Uma médica entrou e disse: “Chamei outro médico para falar com você”. Perguntei o que eu tinha. Ela disse: “Ah, o neurologista vai te explicar”. Ele entrou e foi bem direto: “Esclerose múltipla”. O nome não me dizia muita coisa, mas assustou. O médico disse que eu poderia ter uma vida normal e mais para frente poderia sentir alguma coisa. Saí do quarto e me acabei de chorar. Voltei e perguntei: “Doutor, tenho uma pergunta só: vou poder ser mãe?”. Ele disse que sim. Fiquei um pouco mais tranquila.


 
ÉPOCA – Quando a doença passou a incomodar?

Claudia – Foi por volta de junho de 2009. Passei a sofrer problemas de memória durante as gravações de A diarista. Eu nunca tinha problemas para decorar textos. Me passavam em cima da hora, eu ia lá e fazia. Nunca tinha pedido texto no meio da gravação. O esquecimento me abateu. As gravações foram interrompidas. Fiquei chateada.


 
ÉPOCA – Como a doença a afetava?


Claudia – Não conseguia nem falar, né? Eu falava era um “blã, blã, blã”. Eu tinha dificuldades para andar. Agora estou andando melhor. E a memória, né?


 
ÉPOCA – Como foi interromper a carreira?


Claudia – Foi muito complicado. Eu sou formada em educação física, dei aulas por três anos. Não sinto muitas saudades. Me descobri atriz. Não sei fazer outra coisa. Minha mãe até perguntava se eu iria ficar parada em casa. “Mãe, eu só quero atuar.” (Silêncio.) Fico chateada. Não tinha costume de ficar em casa. Agora fico muito tempo aqui.


 
ÉPOCA – Como era sua rotina nos primeiros meses?


Claudia – Não era nada. Ficava o tempo todo em casa, montando quebra-cabeça e cuidando da minha filha (Iza, de 8 anos).


 
ÉPOCA – O que mais você fazia?

Claudia – Quando era criança, eu tinha mania de passar trotes. E voltei a passar. Eu digo que hoje é dia do Mc Lanche Feliz e pergunto à pessoa qual a loja mais próxima. Aí eu falo, falo, falo, falo… Liguei para algumas amigas que diziam com um “não posso” ou eram grosseiras. Eu chamava de sem coração. Alguns desligavam na minha cara. Era minha onda passar trote. Eu esculachava geral quem não comprava.
      “Eu vejo televisão e penso: ‘Por que não estou lá?’.
       Não quero tomar o papel de ninguém. Só quero atuar”.


ÉPOCA – Você não sentia vontade de sair de casa?

Claudia – Não. As pessoas me chamavam, mas eu não saía. Minha mãe me mandava para a rua. Eu dizia “não quero, para quê?”. Todo mundo vira para você e pergunta “quando você volta?”. “Já, já”, eu respondia. “Mas quando?” “Meu amor, não sei quando, mas já já, eu estou em tratamento e…” “Ah, minha tia também sofre desse problema, sabia?” “Ah, manda um beijo para sua tia.” É chato. Como eu não quero ser grossa, prefiro não sair.
      Sempre tem alguém para te botar para baixo. Eu entrei no Facebook, mas quero sair. Vem alguém e escreve “conheço uma igreja, queria muito que você fosse…”. Outro me pergunta se eu conheço Jesus… sim, conheço Jesus. Minha mãe é católica e eu estudei em colégio batista.

 
ÉPOCA – Como é ficar sem atuar?


Claudia – Eu vejo televisão e penso: “Por que eu não estou lá?”. Não quero tomar o papel de ninguém. Só quero atuar. Depois que você sai do foco, as pessoas te esquecem.


 
ÉPOCA – E o tratamento?


Claudia – Eu fiz em São Paulo. Logo eu, que sempre fiz piada de São Paulo, uma cidade com muita gente, prédio pra caramba, com pessoas que falam mal de carioca… (a agente, paulistana, faz cara feia). Não adianta fazer essa cara, não (risos). Me consultei com o doutor Charles Tibery, do (Hospital Albert) Einstein. Eu falei: “Meu cérebro não está bom, né?”. Ele disse que não. “Então tchau”, respondi. Ele disse: “Tchau, não. Você vai ficar aqui uns dias”. Comecei a tomar o natalizumabe (medicamento) e melhorei muito.


ÉPOCA – E hoje, você acha que está boa?
 

Claudia – Minha memória está bacana. Coisas de que eu não lembrava, como números de telefone, agora eu me lembro. Outro dia lembrei da minha matrícula da faculdade. Eu me sinto bem.


 
ÉPOCA – O que pretende fazer agora?


Claudia – Se Deus quiser, sexta-feira vou ao Projac e gravo uma Ofélia. Tomara que seja a primeira de muitas.


 
ÉPOCA – Ansiosa?


Claudia – Mais ou menos. Quero voltar a interpretar e fazer bem o papel.


 
ÉPOCA – Alguma insegurança?

Claudia – Não.


 
ÉPOCA – Você ensaia em casa?


Claudia – Não.


 
ÉPOCA – Alguma personagem que você viveu lhe serve de inspiração?

Claudia – A Thalía (da Escolinha do Professor Raimundo, que tinha o bordão “vou beijar muuitoo”). Ela é uma mulher que eu queria ser. É péssima, mas se acha “a” mulher. Ela tem uma autoestima muito forte. A Marinete (protagonista de A diarista) é muito correta, muito honesta. Não que eu não seja honesta! (Risos.)



Fonte: Revista Época
          

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