segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

A CEGUEIRA HISTÉRICA DE HITLER




    Em outubro de 1918 o cabo Hitler, então com 29 anos, e um grupo de soldados foram atingidos, de surpresa, por uma nuvem de gás mostarda. Cegos, voltaram ao acampamento e, à exceção de Adolf, todos foram encaminhados a um hospital militar próximo para tratamento dos olhos. Hitler, porém, foi levado a Pasewalk, a 800 quilômetros do acontecido, pois os médicos acreditavam que sua cegueira era menos um trauma físico do que um colapso psicológico. “Não era o caso de que o cabo não pudesse ver, mas sim do que ele não queria ver. Estava sofrendo o que, na época, os médicos chamavam de transtorno histérico e, desde 1917, estabeleceu-se que tais casos deveriam ser tratados não em hospitais gerais, mas em clínicas afastadas para evitar o ‘contágio psíquico'”, observa Lewis.
 
    O ditador que tanto admiraria o rigor viu-se diante de médicos que tratavam esses distúrbios de guerra como “falta de vontade de sistemas nervosos inferiores, com cérebros degenerados”. Dentre o staff psiquiátrico, um deles se destacava por abraçar esse credo: Edmund Forster. “Sempre deixei claro para os pacientes com reações histéricas que aquilo se tratava de um mau hábito, um comportamento antipatriótico e degradante, indigno do soldado alemão”, escreveu. Seu método se resumia a fortalecer a vontade do combatente em retornar ao campo de batalha.
 
    De início curado, ao saber da rendição alemã em novembro o cabo Adolf voltou a ficar cego. Forster foi ainda mais incisivo e o soldado, enfim, se viu recuperado. “Em Minha luta Hitler omite o nome deste médico e muito menos que foi tratado por um psiquiatra, ele diz ter sido ajudado por uma enfermeira de espírito maternal que lhe transmitiu palavras de incentivo que o curaram. Não podemos deixar de notar que esse ocultamento da figura do psiquiatra por uma figura materna é muito significativo aqui. Foram 24 dias de tratamento, que, acreditam os psicanalistas, teria transmutado o artista vagabundo no futuro ditador da Alemanha. Como foram essas sessões é um total mistério, pois, após ascender ao poder em 1933, todos os arquivos clínicos do caso desapareceram. Naquele ano Forster, antinazista, com a ajuda do irmão, encontrou-se em Paris com um grupo de intelectuais exilados, entre os quais Alfred Döblin (o autor de Berlin Alexanderplatz) e Ernst Weiss, um novelista checo amigo de Kafka, ambos com formação médica. O psiquiatra entregou a Weiss todo o dossiê sobre a cegueira do Führer.
 
    Vigiado pelo governo francês, o escritor apenas em 1938 colocou o caso em palavras, ainda assim num romance à clef chamado A testemunha ocular, que fala do soldado A.H. tratado por um médico judeu no hospital militar de P., acometido de histeria.
 
    No livro, o paciente mais tarde se tornava o líder supremo da Alemanha. Na falta do prontuário original, Lewis acredita que várias passagens da obra descrevem como teria sido a terapia de Forster com Hitler. “Eu fui destinado a desempenhar um papel significativo na vida de um homem estranho, o qual, depois da Primeira Guerra Mundial, viria a provocar imenso sofrimento e mudanças radicais na Europa”- fala o narrador de Weiss, o médico judeu.
 
CONTINUA...
 
 
 

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