Os anos 80 duraram só 10 anos, mas serviram de base cultural e intelectual para toda uma geração de gurizada que não conhecia internet, computadores, celular, tv digital e infinitos aplicativos.
Quando a gente é pequeno, parece que o tempo demora muito mais para passar, e nos anos 80 não foi diferente. Eu, por exemplo, comecei os anos 80 com 3 anos de idade e os terminei com 13. Toda minha infância foi vivida nessa década em que aprendi a ler, a escrever, em que fiz amigos na escola e em que as minhas primeiras impressões de mundo foram formadas.
Fiquei deslumbrado com o Et, o Extraterrestre voando de bicicleta em 1983 (primeiro filme que vi no cinema na minha vida), fiquei triste pela morte do Tancredo em 1985, mesmo sem entender de quem se tratava - mas era impossível não se emocionar com aquela gente toda chorando na TV - e esperei o cometa Halley passar nos céus, pois conforme os adultos enfatizavam, eu só poderia vê-lo de novo quando tivesse quase cem anos de idade... E isso, para uma criança de 9 anos é muito tempo.
Não posso negar que sinto um arrepio diferente quando ouço a música do Et até hoje. Sons, imagens e cheiros possuem a horripilante capacidade de nos conduzir por décadas em frações de segundos. Mais tarde, entendi toda a função do Tancredo Neves e a minha pertinente alienação quanto ao momento político em que vivíamos. Eu podia não entender, mas estava lá, respirava aqueles ares, ouvia os adultos falarem sobre inflação, sobre um suposto atentado ao presidente, sobre o mundo que iria acabar no ano 2000, mesmo tanto depois do cometa ter passado.
Não me considero um saudosista, daqueles que colecionam objetos dos anos 80. Coleciono - no máximo - lembranças. Os anos 90 tiveram outro gosto. Duraram menos do que os dez anos intermináveis que existiram entre 1980 e 1989, mas não tiveram o mesmo sabor. Afinal, foi na oitava década do século vinte que descobri que Papai Noel não existia, que os bebês não eram trazidos por cegonhas e que as histórias do Sítio do Pica Pau Amarelo estavam em livros embolorados na biblioteca do colégio.
Nos anos 80, surgiu uma geração que sutilmente foi induzida a achar que tal qual nas novelas da Globo, a vida teria um final feliz no último capítulo. Felizmente - ou infelizmente - , a década seguinte veio para desmentir isso, pois quando crescemos e vamos para o mundo, descobrimos que o final feliz não existe, e que o que importa são os bons momentos. Hoje, quando lembro daqueles primeiros anos de vida, minhas memórias não são em preto e branco, mas sem dúvida, são desgastadas pela ausência de detalhes.
Dia desses, enquanto jantava com um amigo, lembrei-me de um brinquedo que ganhei aos três anos de idade e que se chamava "Vai e vem do Mickey". Fazendo uso do oráculo do século XXI, fui procurar alguma imagem do dito brinquedo para mostrar e me surpreendi... Lá estava ele, o "Vai e vem do Mickey", com seus trilhos amarelos, sua locomotiva transportando um Mickey sem braços que andava circularmente.
Fiquei visivelmente emocionado com as imagens e com o vídeo que encontrei na internet e só então me dei por conta de todos os detalhes sobre aquele brinquedo que eu havia deletado da minha memória. Aos 12 anos de idade, quando o Brasil todo buscava o assassino de Odete Roitman, eu expulsei de casa a criança que adorava os Thundercats e a fiz levar consigo os últimos brinquedos que me restavam - entre eles, o "Vai e vem do Mickey".
Desta forma, o brinquedo que durante uma década acompanhou-me e que tanto povoou minhas fantasias, deu espaço para outros sonhos e novos projetos. Reencontrá-lo tanto tempo depois, mesmo que em imagens no Google, serviu para pensar em todos os brinquedos dos quais me desfiz, das amizades que se dissolveram com as distâncias e dos planos de ser arqueólogo que tive de deixar para trás. Para fechar este pequeno monólogo, decidi colocar o vídeo do "Vai e vem do Mickey", com seus movimentos onde tudo sempre acontecia da mesma forma, no mesmo ritmo, na mesma velocidade... A menos, é claro, que a pilha ficasse fraca, fazendo com que o trenzinho andasse pesado sobre os trilhos. Bons tempos aqueles...
Cristiano Refosco
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