Lyge list (“o direito ao prazer”): ensaio fotográfico que retrata pessoas com deficiência sob a perspectiva da sexualidade (Foto: Kim Steimle Rasmussen) |
Por Amanda Manara , Bianca Caballero e Stella Bonici
Dentre todas as dificuldades que pessoas com deficiência enfrentam, o preconceito e os tabus em relação a determinados assuntos ainda se destacam. Com a sexualidade não é diferente. A sociedade, de modo geral, ainda sustenta uma ideia de que pessoas com deficiência – principalmente física – não possuem, ou têm muita dificuldade em ter uma vida sexual ativa e saudável.
No entanto, as principais dificuldades estão nas crenças e nas informações erradas, realmente na deficiência. “As dificuldades sexuais existem, mas dificilmente são provocadas pela deficiência em si. O que torna difícil a vida sexual de uma pessoa com deficiência é a negação da sexualidade dessas pessoas, por parte da sociedade, e a consequente negligência com a educação sexual nessa população”, afirma a psicóloga especialista em sexualidade Bárbara Lucena.
Com a falta de informações em torno desse tema, diversas crenças errôneas e estereótipos são reforçados. Entre eles, as ideias de que pessoas com deficiência são assexuadas ou até mesmo hipersexuadas, em ambos os casos, incapazes de ter uma vida sexual comum.
Deficiências físicas e as reais impossibilidades
No caso de deficiências físicas, é comum acreditar que não é possível ter uma vida sexual ativa por razões biológicas. Nesses casos, a psicóloga explica que alguns tipos de deficiência podem sim comprometer alguma fase da resposta sexual, mas dificilmente impedem a vivência sexual prazerosa. “Sexo não se limita à penetração ou orgasmo, e uma relação sexual que se completa sem esses atributos não é, necessariamente, inferior ou menos prazerosa. O incentivo à práticas sexuais diversas (masturbação, sexo oral, troca de carícias) e expansão do repertório sexual é recomendado”, explica a psicóloga.
Bárbara afirmou também que a busca de deficientes por especialistas ou tratamentos que os ajudem a ter uma vida sexual saudável vem crescendo, mas ainda é inexpressiva. Muitas vezes isso acontece pois, influenciados pelo preconceito e pela falta de informações, os próprios deficientes acreditam que não podem ter uma vida sexual plena. “As crenças errôneas da sociedade são transmitidas à pessoa com deficiência, que, muitas vezes, passa a acreditar que, em virtude da deficiência, a sexualidade não é um aspecto importante de sua vida”.
A psicóloga ressalta que a sexualidade possui fundamental importância na vida de qualquer ser humano, tenha ele uma deficiência ou não. E complementa que, em geral, pessoas com e sem deficiência possuem o mesmo potencial sexual e afetivo. Quanto à questão da gestação, Bárbara esclarece que, em alguns casos, a deficiência pode sim causar infertilidade. Mas isso não é uma regra, e vale lembrar que a infertilidade acomete tanto pessoas com deficiência quanto pessoas sem ela, e que o aspecto reprodutivo do sexo independe do seu aspecto prazeroso.
Assim, ter uma vida sexual satisfatória é possível para todos que possuem ou não deficiências. Com o acesso a conhecimento, informação e educação sexual e o fim dos preconceitos e crenças equivocadas em torno dessa questão, não há nada que impeça os deficientes de usufruir plenamente de sua sexualidade.
A sexualidade na visão do deficiente
Renato Laurenti hoje é tetraplégico, mas nem sempre foi assim. Após sofrer um acidente de carro há 30 anos, Renato fraturou as vértebras cervicais C4, C5 e C6 e acabou perdendo quase todos os movimentos do corpo. “A minha recuperação foi demorada, pois no hospital uma psicóloga me disse: ‘você nunca mais vai mexer nada, vai ter que aprender a pintar com a boca e sua vida sexual acabou’”, relembra o empresário, que hoje trabalha com produtos voltados à acessibilidade.
No entanto, com o passar do tempo e reunindo um pouco mais de informação sobre o assunto, Renato percebeu que sua vida não precisava ser exatamente assim. Para afirmar suas novas perspectivas, uma das coisas que ele considerava mais improváveis aconteceu: uma mulher se apaixonou por ele. Apesar da novidade, a insegurança tomou conta de Laurenti: “Como vou namorar se não posso transar? Fui atrás desta história direito e vi que não era nenhum bicho de sete cabeças. Graças a Deus a psicóloga estava totalmente enganada. Hoje trabalho, viajo, namoro, e enfim, tenho uma vida normal”.
Para o empresário, diante de uma situação dessas, a melhor forma de continuar com uma vida sexual normal e saudável é conhecer seu novo corpo, suas impossibilidades e limitações. “Sua mobilidade muda, a sua sensibilidade, a sua ereção. Neste momento informação é fundamental. Com informação e reconhecendo seu corpo, a vida sexual pode ser ativa e com muito prazer, pois é como sempre digo, só não transa quem não quer. Lembrando também que é possível ter filhos, tanto o homem como a mulher com deficiência”, completa.
Como o próprio Renato afirmou, “a grande dificuldade está na cabeça de cada um, e em como você lida com isto”. Acima de todas as limitações, está a falta de informação, os conceitos prévios, o medo e o tabu. E abaixo delas, o mundo real da deficiência, que apesar de um pouco diferente e menos acessível devido à sociedade ainda despreparada, é completamente natural – e tudo que é natural, flui.
FONTE:http://jpress.jornalismojunior.com.br/
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