Foi com o uso de uma planta
bastante conhecida na medicina popular que a farmacêutica Ângela Capucho
percebeu uma redução significativa dos efeitos do autismo em seu filho
Vinícius, de 7 anos.
A erva de São João, usada
principalmente para tratar casos de ansiedade e depressão, surgiu como uma
esperança no tratamento do transtorno no final do ano passado, ao ser citada em
uma pesquisa feita em parceria com a Universidade de São Paulo (USP). A eficácia
da planta para pessoas autistas – ainda não comprovada cientificamente – será
testada em uma nova etapa do estudo ainda este ano.
Desde novembro de 2014,
quando começou a ministrar doses da erva de São João para o filho – mesmo sem
ter a comprovação científica dos benefícios da planta – a farmacêutica percebeu
mudanças positivas no comportamento de Vinícius, diagnosticado com autismo
grave.
Segundo ela, as cápsulas
fitoterápicas de hipérico, que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa) determina que só podem ser vendidas com prescrição médica, ajudaram a
reduzir os quadros de estereotipia da doença. “Meu filho ficava o dia inteiro
balançando o corpo ou objetos, no mundinho dele, era mais hiperativo, pulava
muito, gritava, agora está mais tranquilo, diminuiu essa busca pela
estereotipia e parou para prestar mais atenção no mundo ao redor”, comenta
Ângela.
A pesquisa
Melhorias na parte
cognitiva, na memória, no foco e na atenção puderam ser observadas em
voluntários que já utilizaram a planta de maneira preliminar, em chás ou em
cápsulas, segundo o biólogo brasileiro Alysson Muotri, professor da Faculdade
de Medicina da Universidade da Califórnia em San Diego, nos EUA.
ÂNGELA CAPUCHO E SEU FILHO |
Em laboratório, a equipe do
pesquisador “curou” um neurônio autista ao realizar estudos com células-tronco
e aplicar uma droga chamada hiperforina, o princípio ativo encontrado na erva
de São João (Hypericum perforatum).
“O projeto começou quando
começamos a coletar células de polpa de dente de crianças autistas e assim que
essas células chegaram ao laboratório fizemos uma análise genética para
descobrir quais as alterações que o indivíduo possuía em seu genoma. No caso
dessa criança, detectamos mutações no gene TRPC6 além de outros genes”, explica
o pesquisador. O TRPC6 é o gene que regula impulsos nervosos e é importante
para a formação de neurônios.
'Cura' de neurônios
Segundo o estudo, esses
genes autistas possuem menos ramificações e fazem menos conexões que os
cromossomos de uma pessoa sem autismo e o uso de drogas pode reverter os
defeitos nos neurônios de pessoas com o distúrbio. Essa mudança na
característica do TRPC6 pode sugerir que certas doenças do desenvolvimento
neural conseguem ser tratadas ou até mesmo curadas.
Entretanto, o uso da
hiperforina para tratar a doença é restrito, já que há diferentes tipos de
autismo, com alterações em diversos genes. “Nós estimamos que menos de 1% dos
autistas se beneficiariam da erva, pois ela ajudaria apenas uma fração que
carrega mutações especificas no gene TRPC6”, afirma Muotri.
ERVA DE SÃO JOÃO |
Tratamento personalizado
A reprogramação celular que
possibilitou o estudo dos genes em neurônios de pacientes com autismo vai
ajudar a identificar as alterações genéticas presentes em quem possui o
transtorno e, no futuro, poderá oferecer um tratamento personalizado para cada
indivíduo.
“Como o autismo é uma doença heterogênea, pode até ser que
tenhamos tratamentos personalizados para cada paciente, a depender de suas
alterações genéticas”, comenta a pesquisadora da USP Karina Griesi Oliveira.
O uso de drogas específicas
para cada alteração que causa o transtorno neurológico depende do mapeamento
genético dos pacientes. Além disso, a aplicação de medicamentos para tratar o
autismo ainda depende de estudos controlados.
As pesquisas comparativas em
pacientes autistas com o uso da erva de São João, por exemplo, devem começar no
segundo semestre de 2015 no Brasil, após aprovação de um comitê de ética. “É um
resultado promissor, mas entre o resultado e saber se realmente vai funcionar,
não sei quantos anos de pesquisa pode ter ainda”, diz a professora do Centro de
Estudos do Genoma Humano, Maria Rita Passos-Bueno.
Apesar das incertezas e
restrições, a farmacêutica Ângela não tem dúvidas sobre os efeitos medicinais
da planta no tratamento do filho. “Não tem nada comprovado cientificamente para
o autismo ainda e se for esperar vai demorar muito, por isso resolvi tentar”,
diz. “Já dei várias medicações para ele, nenhuma deu resultado e todas davam bastante
efeito colateral. Esta foi uma das únicas medicações que não teve efeito
colateral grave a curto prazo”.
FONTE: G1
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