segunda-feira, 27 de junho de 2011

ACONTECEU NA EUROPA...

     
      Jorge Nascimento quis algo aparentemente simples: comprar uma viagem de avião com partida do Porto e destino a Viena, na Áustria. Ao contrário de qualquer cidadão comum, que levaria cerca de dez minutos na Internet a concretizar esta tarefa, Jorge teve de esperar um mês, até que ontem, após sucessivas trocas de e-mails, decidiu dirigir-se ao balcão de atendimento da TAP no Aeroporto Francisco Sá Carneiro, no Porto, onde esteve mais de quatro horas para, finalmente, conseguir a emissão do ambicionado bilhete. A diferença é que Jorge, de 40 anos e estudante do ensino superior, tem paralisia cerebral e usa uma cadeira de rodas. Jorge Nascimento foi ontem ao aeroporto e só aí resolveu o problema:
      “Não compreendo. Não dá para compreender”, repetia Jorge Nascimento junto ao balcão de atendimento da companhia aérea portuguesa. O estudante da Faculdade de Letras da Universidade do Porto foi ao aeroporto acompanhado de Luísa Magalhães, da associação GAIAC (Grupo de Acção Intercâmbio Artístico e Cultural), que o convidou a participar no projecto europeu Valid Voice, sobre os direitos das pessoas com mobilidade reduzida, que decorre de 23 a 29 de Maio, em Viena. No balcão, para ajudar Jorge, esteve também Carlos Afonso, que o acompanha na viagem a Viena, e José Soeiro, deputado do BE.
      Jorge Nascimento tentou fazer a reserva para o voo, via agência de viagens, a 21 de Abril. Os obstáculos colocados foram muitos: porque era um avião pequeno sem possibilidade de levar a cadeira de rodas no porão, porque Jorge teria de pagar o transporte da cadeira noutro avião como se tratasse de um vulgar envio de carga, porque era preciso dar pormenores sobre o peso da cadeira e informações mais detalhadas sobre a mobilidade do passageiro, porque o voo implicava uma escala e uma mudança para outra companhia aérea…
      Passou quase um mês e a viagem que inicialmente tentou reservar por cerca de 300 euros já custava praticamente o dobro. Revoltado, Jorge Nascimento foi ontem para o aeroporto e recusou sair de lá sem a sua situação resolvida. Saiu com os bilhetes e novo itinerário. Em vez de Porto-Bruxelas-Viena, Jorge e Carlos Afonso vão fazer o voo Porto-Lisboa-Zurique-Viena. Com a cadeira de rodas a bordo e com preço reduzido.
      “Qualquer pessoa compra uma viagem em minutos na Internet e eu fui obrigado a esperar um mês e a ficar aqui um dia para resolver isto. Não é justo. A minha vontade é ir para tribunal”, dizia o estudante de ensino superior, lembrando que há dez anos viajou para a Argentina, noutra companhia aérea, sem problemas. Desta vez, Jorge sente que foi discriminado e, por isso, já com os bilhetes na mão após mais de quatro horas passadas junto ao balcão de atendimento da TAP, pediu o livro de reclamações. TAP admite falhas.
      António Monteiro, porta-voz da TAP, admite que houve falhas. E, por isso, Jorge Nascimento pagou pela viagem o que pagaria há um mês. “Admito que não tenha havido a eficácia desejada para resolver este problema mais rapidamente”, refere o responsável, sugerindo que, em situações “com este tipo de especificidades, e que não são padronizadas”, os passageiros se dirijam aos balcões, onde há “formas directas de relacionamento”. António Monteiro reafirma que o problema foi a impossibilidade de transportar a cadeira com o passageiro no avião que faria o voo entre Porto e Bruxelas. E, rejeitando a acusação de discriminação, concede que “não houve sensibilidade e capacidade de resolver o problema”.
      A TAP violou, com esta atitude, as disposições do Regulamento (CE) n.º 1107/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 5 de Julho de 2006, nomeadamente o disposto:

No Artigo 3.º:

Proibição da recusa de transporte
As transportadoras aéreas, os seus agentes ou os operadores turísticos não se recusarão, com fundamento na deficiência ou na mobilidade reduzida:
a) A aceitar uma reserva para um voo com partida num aeroporto ao qual se aplique o presente regulamento;
b) A embarcar uma pessoa com deficiência ou uma pessoa com mobilidade reduzida num aeroporto ao qual se aplique o presente regulamento, desde que a pessoa em causa tenha um bilhete e uma reserva válidos.

E no Artigo 10.º
Assistência prestada pelas transportadoras aéreas
As transportadoras aéreas devem prestar a assistência especificada no anexo II, sem encargos adicionais, às pessoas com deficiência ou às pessoas com mobilidade reduzida que partam, cheguem ou se encontrem em trânsito num aeroporto a que se aplique o presente regulamento, desde que as pessoas em questão satisfaçam as condições estabelecidas nos números 1, 2 e 4 do artigo 7.º

Fonte: APD

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