terça-feira, 25 de julho de 2017

FALANDO DE INCLUSÃO - FAZ DIFERENÇA QUAL TERMO USAR?






      A Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência (2006) elegeu a atual nomenclatura que norteia o universo da Inclusão quando o tema é deficiência. Sempre que apresento em alguma palestra quais os termos apropriados para nos referirmos às pessoas com deficiência, ouço, entre outras coisas, a seguinte afirmação: "mas isso muda o tempo todo...". Ou ainda: “nem adianta decorar, pois logo já vai mudar”...



      Entendo e até concordo em parte com estas afirmações. Realmente, os termos e as nomenclaturas já mudaram muito nas últimas décadas. Exemplo disso, é o termo “pessoa com Síndrome de Down”, que já foi “mongoloide”, “retardado”, “excepcional” e “especial”. Porém, achar que por conta dessas mudanças não devemos buscar toda a atualização possível, acho um equívoco. Sim, é preciso estudar e conhecer o termo em uso, mesmo que ele mude a cada dois anos. É o mínimo que se espera de um bom profissional, seja ele da educação, da saúde ou de qualquer outra área que trabalhe com o universo da deficiência. Mas, será que estas mudanças na nomenclatura são pertinentes? Será que faz alguma diferença a maneira pela qual vamos chamar o indivíduo que possui algum tipo de deficiência? Ou ainda, o que vai acontecer se continuamos usando termos inadequados para nos referirmos às PCDs?



      Acredito que esta resposta esteja profundamente vinculada ao nosso contexto social, histórico e comportamental. Durante 20 anos, o Brasil viveu mergulhado num regime ditatorial que, tal como um polvo gigante, sufocou a liberdade de opinião e de expressão. Ainda que houvesse uma ferrenha resistência por parte de setores culturais e políticos da sociedade aos efeitos da ditadura, é nítido que os anos de chumbo significaram um período conturbado onde muitos gritos foram contidos. Logo após, com a abertura política nos anos 80, começamos a provar de uma liberdade ímpar que em cinco anos levou-nos até os anos 90. Aí sim, tudo era permitido. Não raro, vemos postagens nas redes sociais relembrando programas de TV dos anos 90, onde tudo era possível, desde “sushi erótico” até mulheres e homens excitados numa competição numa banheira em frente às câmeras. Piadas satirizando negros, gays e pessoas com deficiência e enaltecendo o padrão normativo da sociedade fizeram parte da conturbada enxurrada de informações a que ficamos expostos. E pior: expostos, e sem espaço para questionarmos aonde aquilo tudo iria parar. Foi então que nos últimos anos surgiu um termo tão polêmico quanto necessário e que divide opiniões: o “politicamente correto”. Chamar alguém de preto, de viado ou valorizar atitudes machistas que inferiorizem um gênero em prol de outro passou a ser inaceitável nos últimos anos, ainda que saibamos que os efeitos desse “politicamente correto” só poderá se fazer sentir com mais intensidade num futuro talvez nem tão próximo.



      Quando minha avó nasceu, há cem anos atrás, a abolição da escravatura tinha sido proclamada fazia apenas três décadas, o que é um tempo muito curto dentro de uma perspectiva histórica. Meus avós conheceram um mundo onde as mazelas da escravidão ainda eram muito presentes e onde negros não eram sinônimos de gente, mas sim, de mão de obra desprovida de alma e de sentimentos. Todavia, os conceitos e preconceitos que embasaram o mundo onde meus avós viviam não mudaram muito no último século, de forma que as diferenças de oportunidades e de possibilidades para um negro e para um branco em aspectos como educação e trabalho, infelizmente, ainda são gritantes. Chamar um negro de “macaco” num estádio de futebol ou numa rede social é crime. Dizer que uma mulher foi estuprada porque provocou os estupradores com suas roupas curtas é no mínimo inaceitável. Desta forma, uma avalanche de novos conceitos cada vez mais faz-se presente nos nossos dias, promovendo reflexões e tentando desfazer as amarras às quais mostrávamos presos. Palavras não são apenas palavras, mas sim, pedaços de significados que usamos para expressar nossas ideias, sentimentos e atitudes. Sendo assim, acredito que o politicamente correto – ainda que muitos o critiquem alegando ser ele uma espécie de censura – encontra papel justificável na nossa sociedade. Entender que as mudanças de termos e de nomenclaturas vão muito além do simples uso de expressões da nossa língua, é necessário e até imprescindível, uma vez que ajudam a construir novos conceitos e a destruir preconceitos solidificados por décadas, séculos e gerações.


por Cris

tiano Refosco

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