Responda sinceramente: é um deslize dizer a um cadeirante “corre aqui um minuto”? E pedir para um deficiente visual “dar uma olhada” em alguma coisa? Ao contrário do que muita gente imagina, não. As expressões citadas não são um tabu, muito menos uma ofensa, para quem tem uma deficiência física ou visual. Mas para quem não tem, sim.
“Dizer para um cego ‘perceba isso aqui tactilmente’ seria um verdadeiro absurdo’”, explica João Álvaro de Moraes Felippe, 59 anos, professor de orientação e mobilidade da Laramara, Associação Brasileira de Assistência à Pessoa com Deficiência Visual.
A orientação geral diz que devemos tratar as pessoas com deficiência com naturalidade e respeito às particularidades de cada uma. Mas, na prática, muita gente com boa vontade já tropeçou no próprio desconhecimento ao abordar um deficiente.
Hoje a inclusão social é garantida por diversas leis, mas há 15 ou 20 anos não era comum ver este público em escolas ou no mercado de trabalho. “Não se sabe lidar direito com deficientes porque as pessoas não conviveram com cegos, surdos ou mudos na escola, desde criança”, opina o deficiente visual e revisor de braille Renato José, 32.
Com o tempo, as nomenclaturas para designar as pessoas com deficiência física mudaram, refletindo a nova visão sobre o tema. “Invalidez” ou “portadora de deficiência” caíram em desuso e hoje são termos inadequados. Ainda assim, a nomenclatura também passa por um crivo pessoal. “Tem gente que fica ofendida de ser chamada de cadeirante. Eu já me identifico”, diz a psicóloga, publicitária e deputada federal Mara Gabrilli, tetraplégica em razão de um acidente de carro.
Nas ruas, como relatam os deficientes ouvidos pela reportagem, as pessoas geralmente são bem intencionadas ao oferecer ajuda. “Mas muitas vezes acabam atrapalhando”, atesta o aposentado Nelson Gradim, deficiente visual, 74 anos. Um dos erros mais comuns cometidos com os deficientes visuais é agarrar o braço que segura a bengala. “Este é o olho do cego, é preciso tocar no outro braço”, explica.
A falta de informação e o descumprimento das leis também são um obstáculo para os cegos. Dono de um cão-guia, o labrador Simon, o radialista Alberto Pereira, 36, já passou apuros para chegar a tempo em seus compromissos. “Encontro dificuldade quando preciso de um táxi. Por mais que tenha uma lei, que diz que o cego pode circular com o cão por qualquer lugar público, o taxista normalmente não aceita fazer a corrida. Ele não entende que é um cachorro limpo e treinado”, conta.
Já as pessoas com Síndrome de Down descrevem outro tipo de erro clássico: a abordagem “regredida”, aquela fala com tom de quem se comunica com uma criança. O engano é tão comum que foi tema de um vídeo da campanha “Dê uma ajudinha a si mesmo, reveja seus conceitos," estrelado por Ariel Goldemberg, ator do filme "Colegas".
O ator Breno Viola, também do filme “Colegas” e faixa preta de judô, conta que, quando precisa de ajuda, não hesita em pedir. Mas deixa claro que se vira muito bem sozinho. “Sempre perguntam se eu preciso que contem o dinheiro na hora de pagar alguma coisa. Mas para ajudar a ganhar meu dinheiro ninguém se oferece”, ele brinca, aos risos.
“Esquece, não foi nada” é uma frase proibida na conversa com um deficiente auditivo. Muitas vezes, o interlocutor prefere deixar o assunto para lá por medo de ser insistente. Mas a atitude certa é justamente a contrária. “Tudo é importante para quem não ouve. Simplesmente repita o que foi dito até a pessoa entender”, sugere Paula Pfeifer, blogueira e autora do livro “Crônicas da Surdez”.
Para os cadeirantes, um problema comum é ver alguém apoiado na cadeira de rodas durante uma conversa. Se não há intimidade, o gesto é inadequado, pois a cadeira é uma extensão do corpo do deficiente. “Mas tem o outro lado também. Se é alguém que eu gosto muito, e tenho intimidade, vejo como uma maneira de aproximação”, diz Mara.
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