sábado, 9 de fevereiro de 2013

BOMBEIROS E POLICIAS EM CADEIRAS DE RODAS

       

       Durante os dias 26 e 27 de abril, sessenta policiais e bombeiros que atuam na capital e Região Metropolitana de Curitiba participaram do primeiro curso de acessibilidade específico para policiais militares, organizado pela Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência.
        Eu gostei da ideia, mas ela me fez coçar a cabeça.
        A vivência foi dividida em teoria e prática. No primeiro dia os participantes tiveram contato com conceitos a respeito das diversas dimensões da acessibilidade e suas características, como mobilidade, amputações, audição, visão, lesões musculares, paralisia cerebral e baixo funcionamento cerebral.
        O momento prático foi pautado por atividades que fizeram com que os policiais e bombeiros experimentassem os limites de uma pessoa com deficiência. Eles jogaram bola com os olhos vendados, usaram bengalas, cadeiras de rodas e imobilizaram seus braços. Tudo isso em um ambiente controlado, dentro do espaço onde o curso foi ministrado.
         Ainda de acordo com a Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência, o objetivo da ação foi sensibilizar as corporações para a inclusão e oferecer ferramentas para que uma abordagem mais adequada à pessoa com deficiência seja realizada.
        Um curso como esse, com esse propósito e no contexto atual vale a pena ser debatido. A primeira pergunta que quero lançar tem a ver com a abordagem realizada hoje pela polícia e pelos bombeiros. Eu, infelizmente, não tenho uma história minha para compartilhar, mas adoraria saber de quem tem.
        Você é deficiente e tem uma história de abordagem policial, ou dos bombeiros para contar? Alguém conhece uma história sobre isso?
         A imagem da Polícia Militar passa por um momento de abalo significativo, que tem raízes justamente no relacionamento entre policiais e a sociedade civil. O ano de 2012 foi palco de episódios históricos (e nem um pouco memoráveis), sendo que um deles foi em Curitiba mesmo, bem perto de nós.
        Diferentes equipes da polícia curitibana tiveram uma atuação controversa e polêmica após a apresentação do bloco pré-carnavalesco Garibaldis e Sacis, no Largo da Ordem, em fevereiro deste ano. Após um suposto ato de vandalismo contra uma viatura, policiais da Rone começaram a dispersar a multidão. Eles desceram pelo Largo da Ordem, disparando balas de borracha e bombas de gás nos foliões.
        Entre março e abril tivemos um momento de respiro na relação entre a polícia e sociedade. A instalação da primeira Unidade Paraná Seguro (UPS), no bairro do Uberaba foi marcada por um processo tranquilo, aprovado pela comunidade, como mostra o vídeo produzido também pela Gazeta do Povo.
        Mesmo assim, o episódio teve seu ponto de conturbação: Ismael, um jovem de 19 anos, acusa a polícia de tortura. Em um relato corroborado pela família, vizinhos e advogada, Ismael diz ter sido seguidamente torturado por policiais militares – após supostamente ser confundido com um assaltante – dois dias depois da instalação da UPS. Para saber mais, clique aqui.
        Estamos de fato em um momento (não é o primeiro) que pede esse tipo de humanização. Ter a pessoa com deficiência como personagem desse processo é sim uma boa ideia e, de acordo com as informações que tive acesso, essa ação me pareceu ter foco pontual. Se teve, foi subaproveitada.
        Fazer um curso desse para ensinar uma abordagem adequada quando se lida com uma pessoa com deficiência e parar aí é pouco.
Colocar um policial e um bombeiro numa cadeira de rodas é uma ação que abre portas para muita coisa. Isso mexe com a relação que esse profissional tem com as próprias habilidades e uso da força. Insere-o em um contexto de limitação que é inaceitável no desempenho da atividade prática da profissão.
        Como será que eles se sentiram quando foram vendados, ou limitados fisicamente? Eu não estou falando dos chavões que todo mundo pensa. Estou falando de uma relação mais séria. Eles se sentiram impotentes, fracos e intimidados por essas limitações?
        Provavelmente é assim que muita gente se sente quando sofre abuso de poder e de força.
        Temos uma chance de explorar a inclusão de forma mais orgânica e mais ousada, dentro de corporações vitais para a sociedade. A deficiência física tem uma de suas origens na violência urbana, ou em acidentes que podem ser evitados. Essas origens têm tudo a ver com a razão de existência da polícia e dos bombeiros. Será que esse link foi feito? A deficiência pode ser uma das consequências da não presença desses dois grupos. Que tal falar desse conceito em ações de cultura de paz?
        Fazer isso em um ambiente controlado também me pareceu uma pena. Podíamos colocar as cadeiras e bengalas na rua. Propor que os policiais e bombeiros se virassem para circular nas calçadas, no meio dos carros e no transporte público.
        Seria uma força interessante para a inclusão ter o Corpo de Bombeiros, uma das corporações mais respeitadas e prestigiadas, exigindo melhorias urbanas de acessibilidade.
        Como você acha que a inclusão pode contribuir para uma nova relação da polícia e bombeiros com a sociedade?

Fonte: Rede Saci

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